Pesquisar este blog

sexta-feira, 6 de abril de 2012

A saga inflacionária


“O livro é um mudo que fala; um morto que vive”, ensinava o Padre Antonio Vieira, nas suas notáveis pregações em um Brasil colonial rude e atormentado pela ignorância. Conhecer o passado e a realidade vivente é missão impostergável para as gerações que edificarão o futuro.
Estudar e analisar o passado, nos seus erros e acertos, não é devaneio. É o único caminho que existe para a construção de uma sociedade que contemple o desenvolvimento com justiça social e fundamentada nos valores democráticos. Lutar pela consecução desse princípio universal é missão das novas gerações de brasileiros.
A jornalista Miriam Leitão, competente militante do jornalismo econômico, acaba de lançar o livro “Saga Brasileira – a longa luta de um povo por sua moeda”. É leitura obrigatória para os brasileiros conscientes. Nele, sistematizou e condensou os terríveis desafios que permitiram o Brasil a se livrar da hiperinflação crônica que vinha dinamitando a vida de milhões de famílias. Levando muitas ao desespero de não poder enxergar o futuro para os filhos e netos. Resgata para conhecimento das novas gerações, que não conheceram o câncer inflacionário, o que significa ter uma moeda estabilizada.
A Editora Record ao editar a obra da excelente profissional, colunista do jornal “O Globo”, presenteia os seus leitores com um livro a se incorporar, com méritos, na história econômica brasileira. Nele a autora transcreve números irrefutáveis da calamidade social expressada pela hiperinflação. Nos 15 anos que antecederam o Plano Real, a inflação acumulada foi de 13 trilhões e 342 bilhões por cento.
Comparativamente, a partir do real, de julho de 1994 até dezembro de 2009, a inflação acumulada foi de 196,87%. No apogeu do descontrole inflacionário, entre dezembro de 1979 a janeiro de 1991, com as maxidesvalorizações do ministro Delfin Neto (governo Figueiredo), Plano Cruzado, Plano Verão, Plano Bresser e os Planos Collor I e Collor II, a partir de 1991, a inflação acumulada atingiu a cifra inacreditável de 13 trilhões e 342 bilhões por cento.
“Saga Brasileira – a longa luta de um povo por sua moeda” é leitura direta, objetiva sem a tecnicalidade do economês. E nele o povo é o grande protagonista que convivia diariamente com remarcações de preços, mercadorias que desapareciam para logo em seguida surgir com novos preços. A família brasileira, penosa e dolorosamente, vivia guerra diária para abastecer o seu consumo de alimentos básicos.
E se estendia pelo cotidiano da totalidade das suas despesas e gastos. O economista Pérsio Arida, um dos autores do Plano Real, em artigo no “Globo” (15-05-2011): “Miriam Leitão conta-nos a história da nossa moeda entremeando conversa de bastidores, depoimentos pessoais, erros e acertos da política econômica. Longe dos muitos aborrecidos textos acadêmicos, o que se lê é uma história viva, fluente.”
A hiperinflação recaiu em toda a sociedade, destacadamente nos trabalhadores e assalariados em geral. Alavancando a brutalidade da concentração da renda, punindo pelo empobrecimento os detentores de ganhos fixos. Os donos de capitais e investimentos, naquela conjuntura adversa, tinham mecanismos de defesa do patrimônio. Se nutrindo da indexação da economia que alimentava a hidra inflacionária de modo permanente. Hoje a estabilização econômica é um patrimônio que os brasileiros defendem como extensão das suas vidas.
O livro tem, ainda, o mérito de apontar a origem da hiperinflação. Miriam Leitão é objetiva: “Quero desmistificar a idéia de que na ditadura militar (1964-1985) a política ia mal. Enquanto a economia ia bem. Os governos democráticos herdaram uma bomba, que tiveram de desarmar. Uma herança maldita de descontrole fiscal, dívida externa e correção monetária.”
Hélio Duque
Doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário